Como criar uma organização que aprende

Quando Peter Senge lançou sua célebre obra “A Quinta Disciplina – Arte e Prática da Organização que Aprende” em meados dos anos 90, o mundo era bem diferente do que ele é hoje. Mas ele já parecia antever a revolução digital que estava apenas iniciando e que permitiu a proliferação do conhecimento de uma forma nunca antes ocorrida. Hoje, já quase no final da segunda década do século XXI, vemos o crescimento exponencial de novos conceitos, novos conhecimentos, novas competências. Vivemos uma era na qual uma nova tecnologia que surge pode mudar radicalmente todo o cenário de um determinado mercado. Nesse contexto, criar uma organização que aprende pode se tornar uma questão de sobrevivência e deixa de ser apenas um diferencial competitivo.

Mas afinal, o que significa criar uma organização que aprende?

Trazer o conhecimento de fora para dentro da empresa é uma prática muito comum e bastante valorizada no mundo das organizações. Muitas empresas contratam consultores e mentores experientes, assim como buscam treinamentos de nível cada vez mais elevado. Sabemos que essas práticas são, sem sombra de dúvida, importantíssimas para agregar conhecimento numa organização. No entanto, esse tipo de prática não garante a construção de uma organização que aprende.

Numa organização que realmente aprende, o aprendizado se torna um PROCESSO constante no dia-a-dia, tornando-se uma prática, uma disciplina, algo que é estimulado, valorizado e que se torna um hábito das pessoas. Num ambiente que funciona dessa forma, as pessoas reconhecem que os aprendizados podem acontecer todos os dias. As perguntas mais comuns em locais com essa cultura giram em torno de: “O que podemos aprender com isso?” e não “Quem foi o responsável por essa falha?”. As pessoas nesses contextos são incentivadas a repensar seus processos de trabalho, a desenvolver novas soluções, a montar protótipos e fazer testes. E ninguém fica preocupado em contar quantas vezes se erra até que se consiga acertar. A preocupação está no aprendizado acumulado. A cada aprendizado novo, ficamos mais perto de se conseguir um grande avanço.

Nas organizações convencionais, sempre que alguém traz uma ideia, essa precisa passar por diversos níveis de apreciação e aprovação. Esse processo, na maioria das vezes, permite o aproveitamento de um percentual pequeno das ideias e o processo normalmente é bastante lento. E as ideias que não são aprovadas? Bem, podem acabar ficando numa “gaveta”, adormecidas, sem nunca terem sido experimentadas. Às vezes, elas só precisavam ser lapidadas, ajustadas, para se tornarem excelentes ideias e trazer grandes aprendizados.  Em organizações que aprendem, as pessoas são estimuladas a realizar testes, criar protótipos, experimentar, sempre que novas ideias e oportunidades são identificadas.  Tem alguma ideia? Experimente! Teste! Deu errado? O que podemos aprender com isso? Essa é a cultura predominante numa organização que aprende.

Quando as pessoas fazem as coisas de forma diferente, acabam desenvolvendo novas habilidades e capacidades, o que impacta no mindset instalado. Como consequência as pessoas vão passando para um novo nível de consciência e percepção da realidade, gerando então uma mudança de crenças. À medida que novas crenças se consolidam, reduzindo a percepção de limites, as pessoas vislumbram oportunidades ainda mais arrojadas e assim começam a produzir ideias ainda mais inovadoras, gerando conhecimentos ainda mais avançados. Esse ciclo virtuoso é o ciclo das organizações que aprendem.

Dicas Práticas

Vamos então a algumas dicas práticas para fazer com que o ciclo virtuoso acima se instale na sua empresa?

  1. Permitir e estimular a experimentação – muitas empresas ficam incomodadas com o tempo que será gasto com a realização de testes e construção de protótipos. Têm receio de “perder tempo”. Esquecem-se que esse tempo é um grande investimento na inovação e aprendizado. No Google, por exemplo, todo colaborador pode (e deve) usar 20% do seu tempo em projetos nos quais tenha interesse. Ou seja, ele tem um tempo “livre” para aprender, investir em novas oportunidades e possibilidades. Por isso, essa é a primeira dica para criar uma organização que aprende – permitir e estimular que as pessoas invistam parte do seu tempo em testar coisas novas, desenvolver novos conhecimentos e acumular experiências e aprendizados.
  • Registrar os aprendizados – além de fazer testes, é importante que os aprendizados sejam retidos. Não importa quantas vezes o erro aconteça. Ele pode estar nos levando mais perto do sucesso. Mas, se não for consolidado, ele pode se repetir. Registrar o aprendizado não precisa ser, necessariamente, escrever uma longa dissertação ou manual, mas estimular a reflexão sobre os erros e acertos. Algumas empresas atualmente utilizam a expressão “Post Morten” para denominar os momentos dedicados a avaliar os resultados de uma determinada iniciativa.
  • Identificar potenciais multiplicadores dos aprendizados – numa organização que aprende, novos conhecimentos estão sendo gerados com muita frequência. Alguns deles representam apenas pequenas evoluções de processos. Outros já representam saltos evolutivos importantes. Esses “saltos” muitas vezes são construídos a partir das pequenas evoluções. Algumas pessoas assumem o papel de protagonistas ao liderar esse processo, ao conectar os diferentes aprendizados e consolidar um novo conhecimento. Essas são pessoas chave. Não é tão difícil identificá-las, porque elas são reconhecidas no meio no qual estão inseridas. São pessoas que vão funcionar como Hubs de Conhecimento e têm o potencial de elevar o nível de consciência de um grupo maior, puxando uma evolução ainda mais expressiva. Detalhe: novos multiplicadores podem estar surgindo constantemente. É preciso ficar atento ao surgimento dessas pessoas estratégicas para a Gestão do Conhecimento.
  • Estimular o compartilhamento desses aprendizados – O novo conhecimento adquirido pode se tornar fonte de poder, caso a cultura instalada favoreça o enobrecimento da pessoa que se tornou referência nele. Não é tão difícil que isso ocorra e esse tipo de obstáculo pode “emperrar” a evolução da organização. Para evitar que ocorra, é fundamental que seja valorizada a cooperação entre as pessoas, a disseminação dos aprendizados. Para isso, não basta “obrigar” os detentores do conhecimento a socializá-los, mas é importante criar uma cultura na qual a colaboração seja um valor, que as vantagens de se ter um grupo mais forte e com mais conhecimento sejam muito mais enaltecidas e valorizadas do que o poder individual.
  • Acompanhar a disseminação dos novos conhecimentos – Novos conhecimentos precisam se disseminar rapidamente. Por isso, as trilhas de desenvolvimento precisam ser vivas, necessitam evoluir de forma ágil, para conseguir acompanhar a dinâmica do surgimento e aperfeiçoamento de novas competências e conhecimentos. Nesse contexto, é importante medir o avanço da disseminação desses conhecimentos. Perguntas como: quantas pessoas já detém esse conhecimento? Em que nível detém? Quantas áreas/ unidades já possuem pessoas com esses conhecimentos? Na verdade, ao fazer isso, estamos criando indicadores para acompanhar a evolução dos conhecimentos.
  • Manter o sistema “aquecido” para que novos conhecimentos sejam gerados – Numa organização que aprende, as pessoas sabem que o processo de aprendizado não tem final, não tem um ponto de chegada. Ao contrário, à medida que os novos conhecimentos e competências vão se acumulando, as equipes vão percebendo que o horizonte lhes reserva novas possibilidades ainda mais amplas, numa espiral que nunca tem fim. Por isso é tão importante manter o sistema “aquecido”. Isso implica em criar uma cultura na qual não haja espaço para acomodação. Ao contrário, a abertura para revisões seja parte do mindset das pessoas. Elas então provocam-se mutuamente, questionando-se sobre quais são os próximos passos, quais as novas oportunidades, os novos desafios… Para que isso ocorra, é importante que os sistemas de recompensa e gestão de desempenho se alinhem com essa mentalidade, assim como os programas de desenvolvimento se ocupem em manter vivo esse mindset de crescimento.

Finalizando com uma frase de Peter Senge: “As organizações que aprendem são aquelas nas quais as pessoas aprimoram continuamente suas capacidades para criar o futuro que realmente gostariam de ver surgir.” Que futuro sua empresa quer criar?

Open chat
Precisa de ajuda?
Olá,
Podemos ajudar?